Gota: por que a inflamação atinge as articulações?
Ao contrário do que se imagina, a gota vai muito além de uma simples dor articular ocasional. A condição é uma forma específica de artrite inflamatória, resultante do acúmulo de cristais de ácido úrico nas articulações.
As crises são extremamente dolorosas e incapacitantes, especialmente quando não recebem o devido acompanhamento médico.
Desse modo, compreender as características do quadro é fundamental para quem busca alívio dos sintomas e prevenção de futuros episódios.
O papel do ácido úrico no desenvolvimento da gota
O corpo produz naturalmente a substância durante a decomposição de compostos chamados purinas, compostos nitrogenados do DNA e presentes tanto em células do organismo humano quanto em alguns alimentos.
Nesse sentido, a ocorrência da gota está diretamente relacionada a alterações no metabolismo do ácido úrico.
Em condições normais, a dissolução do composto ocorre no sangue e a eliminação é feita pelos rins por meio da urina.
Entretanto, quando há um desequilíbrio nesse processo, observa-se um acúmulo de ácido úrico no sangue (quadro conhecido como hiperuricemia).
Lentamente, o excesso de ácido úrico se transforma em cristais bem pequenos na corrente sanguínea, depositando-se preferencialmente nas articulações. Esses elementos desencadeiam uma resposta inflamatória intensa do sistema imunológico, resultando em sintomas característicos da gota.
As articulações mais afetadas incluem o dedão do pé (local mais frequente das primeiras crises, englobando cerca de 50% dos casos, segundo artigo da Revista Brasileira de Reumatologia), tornozelos, joelhos, punhos e dedos das mãos.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), a condição é mais comum em homens, sobretudo após os 40 anos: são sete indivíduos do sexo masculino diagnosticados para cada mulher com o quadro (público cuja inflamação é mais comum na fase pós-menopausa). Junto da idade, outros fatores de risco incluem:
- histórico familiar de complicações causadas pelo ácido úrico;
- consumo excessivo de alimentos e bebidas ricos em purinas (como carnes vermelhas e suas respectivas vísceras, frutos do mar, cerveja, vinho e refrigerantes);
- sobrepeso e obesidade;
- sedentarismo;
- presença de quadros crônicos como diabetes e hipertensão arterial;
- episódios anteriores de disfunções nos rins;
- consumo regular de alguns medicamentos (como diuréticos).
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Os principais sintomas da gota
O incômodo mais característico é a dor articular súbita e extremamente intensa, descrita constantemente como uma das piores já experimentadas.
Outro sinal marcante é o de processo inflamatório, que inclui calor, vermelhidão e inchaço localizado. É possível notar ainda:
- limitação de movimento na articulação comprometida;
- sensibilidade extrema ao toque, a ponto de até mesmo o contato com lençóis ou meias causar desconforto;
- febre baixa, em especial em crises mais intensas;
- mal-estar geral;
- formação de nódulos debaixo da pele (tofos) em casos crônicos não tratados.
As crises duram entre algumas horas e alguns dias, mas raramente superam duas semanas. À medida que a condição evolui, a tendência é que os episódios se tornem mais frequentes, principalmente se não houver o acompanhamento adequado.
Apesar disso, entre o intervalo de um quadro inflamatório e o outro, o indivíduo pode permanecer completamente assintomático por meses ou até anos.
Essa característica intermitente não deve ser interpretada como uma cura, mas sim como um período em que a gota permanece “adormecida”, sempre com o potencial de voltar se não houver a atenção necessária.
Por dentro do diagnóstico do quadro inflamatório crônico
O fechamento da hipótese diagnóstica exige avaliação clínica e exames laboratoriais. Todo o processo pode ser conduzido por um reumatologista, o especialista em alterações inflamatórias e autoimunes.
Na prática, a análise do líquido sinovial é o principal recurso na confirmação do quadro. Nesse procedimento, uma pequena quantidade do fluido presente na articulação inflamada é removida através de uma agulha. O material é então examinado sob microscópio para identificar se há os cristais característicos.
Em paralelo, testes de sangue avaliam os níveis de ácido úrico. Todavia, no momento da crise os valores podem estar normais, sem que isso seja suficiente para descartar a gota.
Adicionalmente, exames de imagem como radiografias, ultrassonografia e ressonância magnética auxiliam na identificação de alterações articulares e presença de depósitos cristalinos. Os ultrassons tendem a ser particularmente úteis para detectar acúmulo de cristais mesmo em períodos assintomáticos.
Em alguns casos, o médico pode solicitar análises complementares para investigar aspectos gerais de saúde que influenciam a gota, como função renal, perfil lipídico e glicemia. Alterações do tipo frequentemente evoluem em conjunto com a disfunção do ácido úrico.
A diferença entre gota e pseudogota
Embora ambas provoquem inflamação dolorosa, existem variações importantes. A principal diferença está no tipo de substância responsável pela composição do cristal que causa a inflamação.
Enquanto a gota é causada por cristais de ácido úrico e acomete mais o dedão do pé, a pseudogota é desencadeada por cristais de pirofosfato de cálcio e afeta frequentemente joelhos, punhos e ombros.
Muitas vezes, o acúmulo do mineral forma áreas, principalmente nas cartilagens, endurecidas que se tornam visíveis em radiografias. Isso recebe o nome de condrocalcinose.
Além disso, a pseudogota é mais frequente em idosos que ultrapassaram os 60 anos de idade. Em faixas etárias mais avançadas, ela se torna bastante comum e pode evoluir para degeneração das articulações, causando incapacidade motora irreversível.
Seja como for, a diferenciação correta no diagnóstico é fundamental. Os tratamentos variam entre as duas condições, ainda que algumas medidas terapêuticas sejam similares durante os momentos de dor.
Abordagens necessárias para conter as crises
Durante os episódios inflamatórios, a colchicina, os medicamentos anti-inflamatórios e os corticosteroides costumam ser eficazes no alívio da dor e do inchaço da articulação. O início precoce do tratamento, preferencialmente nas primeiras 24 horas, potencializa significativamente os resultados.
A automedicação deve ser evitada a todo custo. De todo modo, aplicar compressas geladas e manter repouso são medidas que podem ajudar a amenizar a queixa.
O controle em longo prazo visa reduzir os níveis de ácido úrico no sangue. Para isso, há remédios específicos, que atuam diminuindo a produção do elemento ou facilitando sua eliminação pelos rins.
O objetivo é manter os níveis de ácido úrico abaixo de 6,0 mg/dL, conforme orienta cartilha sobre o tema da SBR. Essa meta atenua a possibilidade de novas crises e pode até dissolver gradualmente os depósitos cristalinos existentes.
Acima desse valor, pode haver a formação de novos cristais. Logo, repetir os exames periodicamente é indispensável para manter um melhor controle da situação.
Recomendações mais relevantes para evitar novas crises
Além das medicações, modificações no estilo de vida representam um pilar fundamental na prevenção de episódios futuros.
Um artigo publicado no The American Journal of Clinical Nutrition mostrou que homens mais ativos, que consomem menos álcool, mais frutas e conseguem manter o Índice de Massa Corporal (IMC) adequado têm um risco significativamente menor de desenvolver o quadro.
Ajustes na alimentação
A adequação da dieta inclui principalmente a limitação de alimentos ricos em purinas, como carnes vermelhas, vísceras, frutos do mar (incluindo peixes), bebidas alcoólicas (especialmente cerveja e vinho) e refrigerantes.
A hidratação adequada, com ingestão de pelo menos dois litros de água por dia, facilita a eliminação do ácido úrico pelos rins.
Nessas horas, o suporte de um nutricionista é valioso para adequar a alimentação às necessidades individuais.
Controle do peso
A manutenção da massa corporal adequada contribui para a redução dos níveis de ácido úrico e diminui a sobrecarga nas articulações dos membros inferiores, o que pode agravar a dor durante as crises.
Atividade física regular
O exercício físico constante faz parte de um estilo de vida saudável e auxilia no controle do peso, melhora da circulação e fortalecimento da musculatura ao redor das articulações.
Atividades de baixo impacto, como natação e caminhada, são especialmente recomendadas. Se possível, o ideal é tentar movimentar o corpo pelo menos 30 minutos ao dia, dentro dos limites orientados pelo profissional de saúde.
Gerenciamento de condições associadas
A gestão da hipertensão, do diabetes e de dislipidemias colabora para a diminuição do risco cardiovascular e pode influenciar positivamente nos níveis de ácido úrico.
Por isso, o acompanhamento com especialistas otimiza os resultados do tratamento e previne outros distúrbios de saúde.
A devida atenção pode contribuir também para a prevenção de artrite gotosa, de deformidades articulares permanentes e para a manutenção da função renal. Ainda que não haja cura definitiva, a maioria das pessoas consegue controlar efetivamente a condição e manter um bom patamar de bem-estar.
Fontes:
- Arthritis Care & Research;
- BMC Musculoskeletal Disorders;
- Revista Brasileira de Medicina da Família e da Comunidade;
- Revista Brasileira de Reumatologia;
- Revista Brasileira de Reumatologia;
- National Library of Medicine;
- Sociedade Brasileira de Reumatologia;
- Sociedade Brasileira de Reumatologia;
- The American Journal of Clinical Nutrition.